MANLIO DINUCCI
GUERRA NUCLEAR
O DIA ANTERIOR
De Hiroshima até hoje:
Quem e como nos conduzem à catástrofe
3.4 Os acidentes com armas nucleares
O perigo dos acidentes em que estão envolvidos armamentos nucleares, vem assim descrito, em 1962, pela comissão do Pentágono para a energia atómica:«As armas nucleares são planeadas com muito cuidado, para só explodirem quando forem deliberadamente activadas e lançadas. Contudo há sempre a possibilidade que, em seguida a circunstâncias acidentais, se verifique inadvertidamente uma explosão. Mesmo que se tenham tomado todas as precauções possíveis para evitá-lo, os acidentes deste tipo podem verificar-se em áreas onde as armas estejam juntas e armazenadas, durante o carregamento e o transporte por terra, ou quando se encontram nos transportadores, como um avião ou um míssil».
Entre os contínuos acidentes deste tipo, na ordem das centenas, mais de vinte são muito graves. Em 10 de Março de 1956, um bombardeiro B-47 americano, precipita-se no Mediterrâneo tendo a bordo, cápsulas de material físsil para bombas nucleares. Em 27 de Julho de 1956, na Grã-Bretanha, um outro bombardeiro deste tipo derrapa sobre a pista e, em chamas, esmaga-se contra um depósito que contém seis bomba nucleares. Em 15 de Dezembro de 1965, um Jet A-4E com uma bomba de hidrogénio B-43, desliza para o mar, do porta aviões americano Ticonderoga, a 70 milhas da ilha japonesa Ryukyu, e nunca mais é encontrado.
Muito mais grave é o acidente que se verifica em 17 de Janeiro de 1966 na Espanha meridional: um B-52 americano com 4 bombas de hidrogénio B-28 a bordo, entra em colisão com um avião cisterna, durante o abastecimento em voo a 9.000 metros de altitude. Os dois aviões caem e as três bombas H, com uma potência entre 70 quiloton e 1,5 megaton, caem perto de Palomares, uma aldeola pobre de camponeses a cerca de 2 km da costa, enquanto a 4 bomba acaba no mar. No impacto com o solo, o explosivo não nuclear de alto potencial de duas bombas detona e a explosão espalha plutónio e outros materiais fortemente radioactivos sobre uma vasta área. Durante três meses, 1.700 militares americanos e guardas civis espanhóis trabalham na descontaminação da área, recolhendo 1.400 toneladas de terra e vegetação radioactiva que, fechada em barris, são levadas para as instalações americanas de Savannah River. Enquanto os militares americanos usam roupas protectoras, as mesmas não foram fornecidas aos espanhóis.
A única medida concretizada para proteger os habitantes de Palomares, são a lavagem das casas com detergente e o aviso que os campos podem estar contaminados pelas radiações. Dado que os camponeses continuam a cultivá-los, não se sabe quantas são as mortes atribuíveis à radiação. Uma monitoração, efectuada em 1988 sobre 714 habitantes, revela em 124 deles, uma concentração de plutónio na urina muito superior ao nível considerado seguro.
Dois anos depois do incidente de Palomares, em 21 de Janeiro de 1968, um B-52 americano com 4 bombas de hidrogénio B-28, cai perto da base de Thule, na Groênlandia. No impacto com o gelo, o reservatório do avião, com mais de 130.000 litros de carburante, explode, fazendo detonar os explosivos não nucleares de alta potência das 3 bombas H. A explosão espalha por uma vasta área, urânio altamente enriquecido, plutónio e trítio, que permanecem presos no gelo quando este, depois de ter derretido pelo calor do incêndio, torna a congelar.
No trabalho de recuperação foram utilizados 500 civis dinamarqueses, juntamente com 200 militares americanos. Eles trabalharam durante oito meses, em completa escuridão, até Fevereiro, com ventos de 130 km/h e temperaturas que desceram a 57º C negativos. Recolheram 6.700 metros cúbicos de gelo (10.500 toneladas), de neve e gelo radioactivo e de sucata também radioactiva que, fechados em barris, enviados para as instalações americanas de Savannah River e Oak River.
Nos vinte anos que se seguiram, 100 desses 500 trabalhadores dinamarqueses que tinham efectuado a recuperação ficam doentes com cancro e outras doenças graves entre as quais, a esterilidade. Os sobreviventes pedem, em 1987, uma compensação à Força Aérea Americana, mas ela nega-o, recusando-se também a fazer o rastreio, a longo prazo, dos militares americanos que fizeram a recuperação. A quarta bomba H, que estava a bordo do bombardeiro que caiu, não foi encontrada. O Pentágono esconde o facto às autoridades dinamarquesas, que permanecem no escuro até que o jornal dinamarquês Jillands-Posten (13 de Agosto de 2000), revela a existência da bomba H perdida, especificando o seu número de série (78252).
Sempre em 1968, em 10 de Março, o submarino soviético K-219 de propulsão a diesel afunda-se no Pacífico a cerca de 750 milhas de Hawaii, com três mísseis nucleares SS-N-5 e dois torpedos com ogivas nucleares, a bordo. Em 27 de Maio do mesmo ano, afunda-se no Atlântico, a 400 milhas dos Açores, um submarino americano de propulsão nuclear, o Scorpion, tendo a bordo, além do reactor, dois torpedos com ogivas nucleares. Em 12 de Abril de 1970, afunda-se no Atlântico, a 300 milhas da costa espanhola, o submarino soviético K-8 a propulsão nuclear, com dois reactores e dois torpedos com ogivas nucleares.
Na noite de 22 de Novembro de 1975, no Mediterrâneo, 70 milhas a leste da Sicília, o porta aviões americano John F. Kennedy e o cruzador Belknap entram em colisão por causa do mar muito agitado. O Belknap, sobre o qual se verte o carburante vazado das tubagens destruídas do porta aviões, incendeia-se e arde durante duas horas. Poucos minutos depois do acidente, o Almirante no comando da Striking Force do porta aviões da Sexta Frota lança a Broken Arrow(Flecha Quebrada), o grau de alarme máximo, advertindo o Pentágono da «probabilidade das armas nucleares a bordo do Belknap sejam envolvidas no incêndio e na explosão». Neste, como nos outros casos, não se sabe de que modo a catástrofe foi evitada, nem se têm provas que não se tenha verificado um vazamento de radioactividade.
Ente os múltiplos acidentes que envolvem as unidades navais, há a que acontece em 6 de Outubro de 1986: o submarino soviético K-219 de propulsão nuclear, afunda-se quando está a navegar no Atlântico, a 600 milhas de Bermuda. Além de dois reactores nucleares, estão 34 ogivas nucleares. Elas vão juntar-se ao arsenal nuclear perdido e à contaminação radioactiva que os acidentes inevitáveis deixam às gerações futuras.
A seguir:
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