MANLIO DINUCCI
GUERRA NUCLEAR
O DIA ANTERIOR
De Hiroshima até hoje:
Quem e como nos conduzem à
catástrofe
1.2 Os efeitos da explosão nuclear sobre uma cidade
A bomba de Hiroshima, à luz dos
sucessivos desenvolvimentos de tais armamentos, aparece como a chave da era
nuclear. Com um terço do urânio 235 usado para o LITTLE BOY,
construíram-se, não muito tempo depois, dispositivos 8 a 9 vezes mais potentes
que, se forem usados para activar uma bomba de hidrogénio, produzem uma explosão
mil vezes mais destruidora. A relação potência-peso (a medida padrão de
eficiência de um dispositivo explosivo), que na bomba de Nagaski é de cerca de
5.000, é elevada a 3.500.000.
Para perceber quais são
os efeitos destruidores de tais armas, toma-se como exemplo, o
de uma única explosão nuclear sobre uma cidade: a unidade adoptada para tais
cálculos – efectuados sobre a base da experiência de Hiroshima e Nagasaki e das
explosões nucleares experimentais – é, em geral, uma bomba de 1 megaton (MT),
semelhante à explosão de uma tonelada de TNT (para cujo transporte, foi
calculado ser necessário um comboio de mercadorias de 500 km de extensão). É uma
arma cuja potência equivale a 75 bombas de Hiroshima.
No cálculo deve considerar-se,
em primeiro lugar, os factores variáveis, dos quais depende o fluxo e o tipo de
efeitos da explosão nuclear. Uma explosão no solo concentra uma onda de choque
(onda de pressão do ar, produzida pela explosão) e calor, mais intensamente a
nível do solo, reduzindo os efeitos, mas aumenta o dano da queda de partículas
radioactivas no solo e incêndios. Uma humidade mais elevada da atmosfera reduz
os danos dos incêndios, mas aumenta notavelmente a radioactividade. Durante o
verão ou num clima quente, nota-se um maior número de queimados, pois que
muitas pessoas encontram-se ao ar livre e com roupas ligeiras. Num dia feriado,
regista-se maior número de vítimas, pelo encerramento dos escritórios, fábricas
e escolas.
Calcula-se que a devastação
máxima seria provocada pela detonação de uma bomba nuclear de 1 megaton a uma
altitude de 2.000 metros, num dia feriado durante o horário de trabalho, num
dia quente de verão límpido, seco e ventilado.
Os efeitos da explosão são
calculados, com base numa série de anéis (coroas circulares compreendidas entre
duas circunferências concêntricas de raios) em volta do ground zero,
o hipocentro, o ponto da superfície terrestre sob a vertical da explosão. Cada
um de nós, com um mapa e um compasso, pode calcular quais os efeitos que
provocaria sobre o seu próprio território, a explosão de uma bomba nuclear de 1
megaton.
No primeiro anel, num raio de
de 2,8 km do ground zero, a destruição e a letalidade são totais. A
onda de choque, devida à compressão do ar a seguir à explosão, exerce uma
pressão excessiva compreendida entre 20 a 200 psi (psi = libra-força por
polegada quadrada), provocando o esmagamento, o colapso e a explosão mesmo dos
edifícios mais sólidos em aço e cimento armado. A deslocação do ar, com ventos
de 800 km/h, transforma-os em projecteis mortíferos. A irradiação térmica da
esfera de fogo (esfera de gás incandescente produzida pela explosão nuclear),
na ordem de mais de 27 milhões de graus Fahrenheit – cujo brilho a mais de 100
km de distância é 30 vezes mais intenso do que o Sol tropical ao meio dia –
vaporiza as pessoas e as coisas na zona do hipocentro, derrete na área
circundante o aço e o vidro, faz explodir o cimento. Todas as pessoas dentro
deste anel, morrem quase instantaneamente: vaporizadas, esmagadas,
carbonizadas. Dada a ausência de sobreviventes, não há problemas médicos.
No segundo anel, compreendido
entre 2,8 e 4,2 km do ground zero, picos de pressão excessiva de 10
a 20 psi e ventos de 450-550 km/h, suficientes para lançar com força um homem
de oitenta quilos a 100 metros de distância, provocam a morte a 50% dos
habitantes por lesões de choque: caixas toráxicas esmagadas, fracturas do
crânio, feridas penetrantes do tórax e do abdomen, lesões dos pulmões e de
outros orgãos internos, lesões da medula espinal, lacerações múltiplas e
hemorragias internas. Todas as pessoas expostas sofrem queimaduras de terceiro
grau, a menos que se tenham refugiado num edifício que permaneça suficientemente
inteiro (a irradiação térmica antecede a onda de choque). O calor faz evaporar
os caixilhos de alumínio e incendiar as roupas.
No terceiro anel, compreendido
entre 4,2 e 7 km do ground zero, pressões excessivas de 5 psi,
suficientes para exercer uma pressão de 180 toneladas contra uma parede de um
edifício de dois andares e ventos de 280 km/h danificam gravemente mesmo os
edifícios mais sólidos. Fragmentos de cimento, aço, vidro viajam a velocidades
letais. O calor, cerca de 40 calorias por centímetro quadrado, derrete o
asfalto das estradas, incendeia a madeira e os tecidos no interior das
habitações. Predominam ainda as lesões produzidas pela onda de choque. Ao mesmo
tempo, todas as pessoas ao ar livre, sofrem queimaduras de terceiro grau. A
maior parte das pessoas expostas indirectamente à esfera de fogo, ficam
temporariamente cegas pelo brilho: muitas referem queimaduras da retina com
cegueira parcial ou total, muitas ficam surdas pela ruptura dos tímpanos.
No quarto anel, compreendido entre
7 e 7,8 km do ground zero, pressões excessivas de 4 psi e ventos de
250 km/h – uma força maior do que a de um furacão - destroem as casas de
tijolos, mas deixam de pé os edifícios mais sólidos, os quais, no entanto,
alimentam os incêndios provocados pela irradiação térmica (25 calorias por cm2,
suficientes para incendiar tecidos e provocar queimaduras de terceiro grau
sobre a pele desprotegida), e a detonaçãode tubos de gás, gasolina e gasóleo.
No quinto anel, compreendido
entre 7,8 e 10 km do ground zero, pressões excessivas de 3 psi e
ventos de 160 km/h são ainda bastante fortes para empurrar as pessoas para fora
dos edifícios. O calor é ainda suficientemente forte para provocar queimaduras
de terceiro grau em 80% das pessoas que não estão resguardadas e de incendiar
erva e folhas secas, jornais e vestuário de nylon. A percentagem de mortos,
nesta área, reduz-se a cerca de 5%, mas a dos feridos graves permanece alta:
cerca de 45%. Como no quarto anel, também neste desenvolvem-se incêndios
violentos.
No sexto anel, compreendido
ente 10 a 13, 6 km do ground zero, pressões excessivas de 2 psi e
ventos de 100-130 km/h são ainda bastante fortes para partir os vidros das
janelas e transformar os detritos mais pequenos em projecteis letais, derrubar
cerca de 30 % das árvores e de postes de iluminação, danificar as casas de
tijolos. O calor, de 5-7 calorias por centímetro quadrado, provoca queimaduras
de terceiro grau a uma pessoa em cada cinco, que estejam ao ar livre e
queimaduras de segundo grau em 70% da população dessa área.
Os efeitos destruidores da
irradiação térmica e da onda de choque de uma bomba nuclear de 1 megaton
estendem-se, em seguida, circularmente até cerca de 14 km do ground
zero. Se a bomba que explodir for um engenho de 2 megaton, a área de destruição
e mortalidade total estende-se num raio de 4,8 km em volta da ground
zero e é aquela em que se relatam queimaduras de terceiro grau na
epiderme exposta, até um raio de 17 km. Se explodir uma bomba de 20 megaton, a
área de destruição e mortalidade estende-se num raio de cerca de 14 km do ground
zero e os efeitos destruidores vão até um raio de 60 km. Engenhos
ainda mais potentes provocam, proporcionalmente, destruições num raio ainda
maior.
Mas não é suficiente. Se, como
é muito provável, numa grande cidade atingida por uma explosão nuclear, se cria
uma «tempestade de fogo» - um incêndio enorme, intenso mas estacionário, que
envolve temperaturas superiores a 800º C, absorvendo o ar frio e criando ventos
de 300 km/h – a área letal aumenta 50 vezes e o número de queimados aumenta
enormemente.
Aos efeitos da irradiação
térmica e da onda de choque juntam-se os das radiações. Não é em tal alto grau
que a irradiação nuclear inicial – um intenso fluxo de neutrões e raios gama –
aumenta o número das vítimas, na medida em que as pessoas expostas são mortas
pela irradiação térmica e pela onda de choque antes da irradiação nuclear
instantânea.
Só no caso de explosão de um
engenho de radiação intensificada (a bomba de neutrões), a área da irradiação
letal de neutrões e raios gama é mais alargada do que a da irradiação térmica e
da onda de choque.
A seguir
Tradutora: Maria Luísa de Vasconcellos
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