Membros
de uma equipa norte-americana que realizou um voo sob o Tratado de Céu Aberto
sobre a Rússia posam na Praça Vermelha em Moscovo, em 11 de Abril de 2006.
(OSCE)
Trump, o ‘Serial Killer’ dos Tratados
Manlio Dinucci
O Presidente Trump anunciou a retirada dos Estados
Unidos do Tratado Céus Abertos/Open Skies. Assinado em 1992,
imediatamente após o final da Guerra Fria e iniciado em 2002, permite que cada
um dos 34 Estados Partes sobrevoe os territórios dos demais com aviões de
reconhecimento (desarmados), equipados com sensores para recolher dados sobre
forças e actividades militares. Cada Estado Parte deve aceitar um certo número
de sobrevôos sobre o seu território, a cada ano e tem o direito de realizar o
mesmo número nos territórios daqueles que realizaram esses vôos. Nos termos do
Tratado, mais de 1.500 vôos foram realizados desde 2002, incluindo vôos
recíprocos entre os Estados Unidos e a Rússia. Embora, actualmente, os
satélites possam fornecer informações mais detalhadas do que as recolhidas
pelos aviões, o Tratado mantém a sua utilidade técnica, pois nem todos os
Estados Partes têm as capacidades dadas pela utilização de satélites. O
significado político do Tratado permanece importante como um acto de confiança.
Aponta precisamente para um abrandamento, daí a decisão da Administação Trump de se retirar do Tratado, com o
objectivo claro de aumentar a tensão com a Rússia. Para esse fim, o mesmo
argumento foi adoptado em 1 de Fevereiro de 2019, quando o Secretário de Estado,
Mike Pompeo, anunciou que, após seis meses de suspensão, os Estados Unidos se
retirariam do Tratado das Forças Nucleares Intermédias, como de facto aconteceu
em Julho do mesmo ano. Ao anunciar que os Estados Unidos se retirarão dentro de
seis meses do Tratado Céus Abertos, Mike Pompeo usa praticamente as mesmas
palavras: declara que “só a Rússia é responsável por estes procedimentos”, acusa-a
de “erosão contínua da arquitectura do controlo dos armamentos”, define-a como “violadora obstinada de muitos compromissos assumidos”. Também desta vez, não é apresentada
nenhuma prova real destas argumentações.
Declarando que “esta não é uma
história que se refira exclusivamente ao Tratado Open Skies”, o Secretário de
Estado anuncia outras decisões da Administração Trump na mesma direcção.
Durante mais de um ano, o Presidente Trump repetiu que não renovará o novo
Tratado Start, concluído em 2010 pelos Estados Unidos e pela Rússia. Este Tratado,
como salientamos em 2010, no ‘il manifesto’,
tem limites notáveis: estabelece apenas um limite para “ogivas nucleares
instaladas”, ou seja, aquelas prontas para serem lançadas por meios de
transporte estratégicos com alcance superior a 5.500 km, fixados em 1.550 por cada parte; também não prevê nenhum controlo efectivo sobre o aprimoramento
qualitativo das forças nucleares. No entanto, a retirada dos Estados Unidos do
novo Tratado Start tornaria o confronto nuclear ainda mais perigoso. O Presidente
Trump disse que só poderia renovar o novo Tratado Start se a China também
participasse no mesmo, uma possibilidade até agora rejeitada por Pequim. No
entanto, se participar, nos termos actuais, a China poderia aumentar o número
das suas ogivas nucleares de cerca de 300 para mais de 1.500 (excluindo a hipótese
de que Washington e Moscovo estariam dispostos a diminuir as deles para 300
unidades).
Outro tratado do qual os Estados
Unidos podem retirar-se é o da Proibição Total de Ensaios Nucleares, que
Washington assinou em 1996, mas nunca ratificou, enquanto Moscovo o ratificou
em 2000.
Neste contexto, a anunciada
retirada dos Estados Unidos do Tratado Open Skies constitui um novo passo em
direcção a uma verdadeira e deliberada estratégia de tensão. Visto que aderiram
ao Tratado 23 países europeus da NATO, incluindo a Itália, a retirada dos
Estados Unidos, aumentando as tensões com a Rússia, envolve automaticamente a
NATO. É exactamente o que pretendem em
Washington. Num comunicado de imprensa conjunto publicado ontem, 8 países
da NATO (Bélgica, França, Alemanha, Itália, Luxemburgo, Holanda, República Checa,
Espanha), além da Finlândia e da Suécia, manifestaram o seu “descontentamento”
pela intenção da retirada do Tratado Open Skies, anunciada pelo governo dos
EUA, “embora partilhemos as suas preocupações sobre a actuação da parte da Federação Russa sobre as cláusulas do Tratado”.
No entanto, declaram: “Continuaremos a
dar cumprimento ao Tratado Céu Aberto”. Um sinal de abertura cauteloso, mas
apreciável, enquanto a sombra ameaçadora da guerra nuclear cobre cada vez mais
os céus.
Tradutora: Maria Luísa de Vasconcellos
Email: luisavasconcellos2012@gmail.com
Webpage: NO WAR NO NATO
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