As palavras embaraçosas do Papa Francisco, a partir de Hiroshima:
«A bomba
atómica é imoral e criminosa».
Silêncio
bipartidário sobre o Papa
Manlio Dinucci
NdT: tradução actualizada de acordo com o site:
http://www.natoexit.it/2019/11/29/latomica-immorale-e-criminale-silenzio-bipartisan-sul-papa/
Silêncio
de tumba no arco institucional italiano, sempre loquaz sobre o Papa, sobre as
palavras proferidas por Francisco, em 24 de Novembro, em Hiroshima e Nagasaki: “O
uso da energia atómica para fins de guerra é hoje, mais do que nunca, um crime.
É imoral a posse de armas atómicas ”.
Palavras
embaraçosas para os nossos expoentes máximos institucionais que, como os
anteriores, são responsáveis pelo facto de que a Itália, um país não nuclear,
hospede e esteja preparada para usar armas nucleares americanas, violando o
Tratado de Não Proliferação ao qual aderiu, que proíbe aos Estados militarmente
não nucleares, receber armas nucleares e controlá-las directa ou indirectamente.
Responsabilidade ainda mais grave porque a Itália, como membro da NATO, recusou-se
a aderir ao Tratado sobre a Proibição de Armas Nucleares, votado pela grande
maioria da Assembleia Geral da ONU: que obriga os Estados signatários a não
produzir nem possuir armas nucleares, não usá-las ou ameaçar usá-las, não
transferi-las ou recebê-las directa ou indirectamente, com o objectivo da sua
eliminação total.
EMBARAÇOSA
para os governantes, a pergunta que o Papa Francisco faz, de Hiroshima: “Como
podemos falar sobre paz enquanto construímos novas e formidáveis armas de
guerra?” Em Itália, as bombas nucleares actualmente estimadas, são cerca de 70,
todas do modelo B61, mas estão para ser instaladas no território italiano, as
novas e mais mortíferas bombas nucleares USA B61-12 (número ainda desconhecido)
no lugar das actuais B-61. A B61-12 possui uma ogiva nuclear com quatro opções
de potência seleccionável: no momento do lançamento, é escolhida a potência de
explosão, dependendo do alvo a atingir.
Ao contrário da B61, lançada na vertical sobre o alvo, a B61-12 é lançada a
distância e guiada por um sistema de satélite. Tem, também, a capacidade de
penetrar no subsolo, mesmo através de betão armado, explodindo em profundidade
para destruir os bunkers dos centros de comando e estruturas subterrâneas, de
modo a “decapitar” o país inimigo, num ‘first strike’ nuclear.
IGUALMENTE
EMBARAÇOSA é a outra pergunta do Papa: “Como podemos propor a paz se usamos
continuamente a intimidação bélica nuclear como recurso legítimo para a resolução dos conflitos?” A
Itália, como membro da NATO, apoiou a decisão de Trump de cancelar o Tratado
INF que, assinado em 1987 pelos Presidentes Gorbachev e Reagan, tinha permitido
a eliminação de todos os mísseis nucleares de alcance intermédio com base no
solo, distribuidos na Europa, incluindo aqueles instalados em Comiso. Os USA
estão a desenvolver novos mísseis nucleares de alcance intermédio, tanto de
cruzeiro como balísticos (estes capazes de atingir alvos poucos minutos após o lançamento),
a serem distribuídos na Europa, certamente também em Itália, contra a Rússia e
na Ásia, contra a China. A Rússia advertiu que, se forem disseminados na
Europa, apontará os seus mísseis nucleares para os territórios nos quais serão
instaladas.
AS
POTÊNCIAS NUCLEARES possuem um total de cerca de 15.000 ogivas nucleares. Mais
de 90% pertencem aos Estados Unidos e à Rússia: cada um dos dois países possui
cerca de 7 mil. Os outros países que possuem ogivas nucleares são: França
(300), China (270), Grã-Bretanha (215), Paquistão (120-130), Índia (110-120),
Israel (80), Coreia do Norte (10- 20). Cinco outros países - Itália, Alemanha,
Bélgica, Holanda e Turquia - têm em conjunto, cerca de 150 ogivas nucleares
americanas instaladas nos seus territórios. A corrida armamentista está a
ocorrer agora, não em quantidade, mas em qualidade: ou seja, no tipo de
plataformas de lançamento e nas capacidades ofensivas das ogivas nucleares.
Um
submarino americano da classe Ohio é capaz de lançar, em menos de um minuto, 24
mísseis balísticos Trident armados com 120 a 190 ogivas nucleares, cujo poder
explosivo é mais do dobro de todos os explosivos não nucleares, usados na
Segunda Guerra Mundial. O novo míssil balístico intercontinental russo, Sarmat,
com um alcance de 18.000 km, é capaz de transportar de 10 a 16 ogivas nucleares
que, ao reentrar na atmosfera em velocidade hipersónica (mais de 5 vezes a do
som), manobram para escapar aos mísseis interceptores.
E
QUANDO o Papa Francisco afirma que o uso da energia nuclear para fins de guerra
é “um crime não apenas contra o Homem e sua dignidade, mas contra qualquer
possibilidade de futuro na nossa casa comum”, que põe em perigo o futuro da
Terra, aqui não devem calar-se os que estão empenhados na defesa do meio ambiente:
porque a ameaça mais grave para o ambiente da vida no planeta é a guerra
nuclear e é prioritário, o objectivo da eliminação completa das armas atómicas.
Falta
ver até que ponto o aviso lançado pelo Papa Francisco, a partir de Hiroshima, é
recebido na própria Igreja e em geral entre os católicos. Não é a primeira vez
que ele lança esse alerta, mas sua voz, para usar uma frase do Evangelho,
assemelha-se à de “alguém que grita no deserto”. Neste ponto, surge
espontaneamente uma proposta laica: Se falta a consciência, que se revele, ao
menos, o instinto de sobrevivência.
il manifesto, 26 de Novembro de 2019
http://www.natoexit.it/
Manlio Dinucci
Geógrafo e geopolitólogo. Livros mais recentes: Laboratorio di geografia, Zanichelli 2014 ; Diario di viaggio, Zanichelli 2017 ; L’arte della guerra / Annali della strategia Usa/Nato 1990-2016, Zambon 2016, Guerra Nucleare. Il Giorno Prima 2017; Diario di guerra Asterios Editores 2018; Premio internazionale per l'analisi geostrategica assegnato il 7 giugno 2019 dal Club dei giornalisti del Messico, A.C.
Tradutora:
Maria Luísa de Vasconcellos
Email: luisavasconcellos2012@gmail.com
Webpage: NO WAR NO NATO
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