Os responsáveis da central, que pertencem à empresa Met Edison e a
autoridade, fazem tudo para esconder o acidente, cuja notícia escapa só porque
um colaborador de uma estação radiofónica local, intercepta por acaso, com a
sua aparelhagem CB, uma comunicação dos bombeiros. Quando, às 13:50, se escuta na sala abarrotada de controlo, um rumor surdo
provocado pela explosão do hidrogénio, no coração do reactor, os dirigentes
explicam que é só o bater de uma ponte levadiça da instalação de arejamento
(«para não provocar o pânico», dirão depois). Entretanto, aumenta no exterior a
radioactividade, acrescida do facto de que a direcção da central, faz
descarregar no rio, sem comunicar nada às autoridades, um milhão e meio de
litros de água radioactiva acumulada no interior da central. Espalha-se a
notícia da possível explosão do núcleo do reactor, o governador faz evacuar
3.500 crianças e mulheres grávidas e pede aos habitantes para se fecharem em casa.
Mas o pânico espalha-se e outras 100 mil pessoas fogem. A América está com a
respiração suspensa até 2 de Abril quando, miraculosamente, a bolha de hidrogénio
do reactor é reabsorvida, evitando a explosão.
As consequências para a saúde do acidente de Three Mile Island nunca
foram oficialmente reconhecidas. Segundo as autoridades, os indícios
epidemiológicos, efectuados nos anos seguintes, não evidenciaram nenhum aumento
de tumores e de leucemia devido às radiações. Por outro lado, numerosos
pesquisadores privados, afirmam o contrário. «Diversas centenas de pessoas, no
momento do acidente, acusaram náuseas, vómitos, queda de cabelo e irritações
cutâneas, e muitas disseram que os seus animais domésticos morreram ou
mostraram sinais de exposição às radiações», afirma um estudo publicado em
1997, pelos pesquisadores da Universidade da Carolina do Norte, os quais
sublinham «ter encontrado, depois de 1979, um impressionante aumento da
incidência de casos de cancro na zona sotavento, referente à central de Three
Mile Island». Os pedidos de compensação, apresentados por 2.000 habitantes da
zona, acompanhados de atestados médicos, foram rejeitados, em 1996, pelo juiz
do tribunal da comarca distrital.
Central Nuclear Soviética de
Chernobil
Ainda mais desastroso é o acidente que acontece em Chernobil, em Abril de
1986. Apenas dois meses antes, o Ministro da Energia da República Ucraniana,
assegurava: «As probabilidades de um acidente no núcleo da central, são de 1
para 10.000. Temos aqui, em Chernobil, para cada reactor, três sistemas de
protecção que operam de modo independente, uns dos outros. Também o ambiente
exterior está protegido: os edifícios são selados hermeticamente e existem três
sistemas de purificação das escórias tóxicas, que excluem qualquer descarga na
atmosfera». «O Homem e a Natureza estão completamente seguros». – garantia o Director
da central - «Mas, se acontecesse o impossível, o controlo automático dos
sistemas de segurança desligavam o reactor, no espaço de poucos segundos».
O acidente verifica-se às 01:23h, do dia 26 de Abril de 1986, enquanto os
trabalhadores conduzem uma experiência de rotina num dos quatro reactores: um
RBMK-1000 de mil megawatt, adaptação para uso civil de um reactor militar, projectado
para produzir material físsil para armas nucleares. Em três segundos, sem que
houvesse tempo de activar os sistema de segurança, a produção de energia do
núcleo eleva-se 100 vezes acima do nível máximo normal, fazendo subir enormemente
a temperatura. Duas explosões atravessam a placa de metal de 2.000 toneladas, que
sela a parte de cima do reactor e destroem o edifício, lançando no ar os fragmentos
incandescentes e altamente radioactivos do núcleo.
«Tudo acontece como num conto de fadas desconhecido» - conta sucessivamente,
uma mulher de Chernobil. No céu, a grande altura, apareceram de improviso, a girar, estrelas enormes que
pareciam acender-se e depois, momentaneamente, despenhavam-se, caindo, como um
gigantesco fogo de artifício. Ficámos fascinados a ver aquele espectáculo insólito
e belíssimo, e chamamos as crianças para que elas também o desfrutassem. Depois
as estrelas desapareceram e apenas permaneceu uma fuga de fumo que,
ocasionalmente, se coloria de fogo. Depois fomos dormir com a esperança de que,
na noite seguinte, o fenómeno se repetisse. No dia seguinte, o espectáculo da
noite anterior foi o tema de todas as conversas. E quando chegou a noite,
muitos habitantes de Cernobil tornaram a contemplar o céu. Mas o espectáculo
não se repete, a não ser algum brilho que, de vez em quando, aparece no
horizonte. No domingo quase tínhamos esquecido, quando os primeiros rumores,
vagos e confusos, alcançaram Chernobil. Diziam que tinha havido uma falha no
reactor, mas que não era grave e que se estava a providenciar a eliminação da mesma.
Visto que as autoridades locais estavam silenciosas, pareceu que fosse de
proporções limitadas. O alarme estalou na segunda-feira. As crianças voltaram
da escola antes do habitual e disseram que lhes tinha sido recomendado para não
saírem de casa, para lavar os cabelos e mudar de roupa. Encontrei o meu marido
em casa. Disse-me que tinha sido comunicado aos operários da sua fábrica para
se prepararem para sair de Chernobil com as suas famílias. Só naquele momento, é que tivemos
a sensação clara de uma catástrofe».
A catástrofe de Chernobil provoca o lançamento de uma radioactividade
equivalente a 200 vezes a totalidade lançada pelas bombas de Hiroshima e
Nagasaki. Na Ucrânia, Rússia e Bielorússia, contamina uma área total de mais de
160.000 km2, habitada por cerca de 9 milhões de habitantes. A nuvem radioactiva
espalhou-se, em grande parte, na Europa Central e Oriental e, também, na Europa
Ocidental, abrangendo a Itália Setentrional e Central.
As consequências para a saúde são agravadas pelo facto de que, as
autoridades soviéticas, quer centrais, quer locais, esperarem mais de dois dias
antes de dar, ao meio dia de 28 de Abril, o anúncio oficial do desastre. Ao
mesmo tempo as autoridades dos EUA revelam que a CIA estava ao corrente, em 26
de Abril, do acidente na central nuclear. Esta demora impede a evacuação
imediata dos habitantes e atrasa a adopção de medidas de urgência, na área
atingida pela nuvem radioactiva, contribuindo para aumentar o número de vítimas.
Nos dias e semanas seguintes à explosão do reactor, cerca de 13.000
crianças da região de Chernobil, respiram ar contendo níveis elevados de iodo 131,
um isótopo radioactivo que se acumula na tiróide: como consequência, a
incidência de tumores na tiróide das crianças, aumenta cerca de 10 vezes. Na
Bielorússia, cuja fronteira dista 50 km de Chernobil, o cancro da tiróide
manifesta-se com uma frequência 285 vezes maior do que antes. Mais de 800.000
crianças e adolescentes, na Bielorússia e na Ucrânia, arriscam contrair a mesma
doença que, de 1986 a 1995 já matou 600 dos seus conterrâneos e, por esse
motivo, são tidas sob controlo médico apertado. O número de mortos por causa da
contaminação radioactiva é indeterminado: as estimativas vão de 30 mil a mais
de 300 mil. Segundo algumas estimativas governamentais, as mortes ligadas à
catástrofe nuclear foram, num espaço de dez anos, 180 mil na Ucrânia e 120 mil
na Bielorússia. As pessoas atingidas, mais ou menos, gravemente – avalia a UNESCO – são 4.900.000. Particularmente
expostos às consequências das radiações estão os bombeiros que apagam o incêndio
do reactor, pois sabem quais são os riscos, e os 800 mil militares, operários e
técnicos que efectuam os trabalhos de descontaminação e de construção do
«sarcófago», a estrutura de betão armado e aço, construída em volta dos restos
radioactivos do reactor que explodiu, compreendendo mais de 400 quilogramas de
plutónio e 100 toneladas de combustível nuclear. Segundo uma avaliação
confiável, morrem cerca de 10 mil, enquanto muitos outros, provavelmente mais
de 250 mil, foram atingidos por doenças do aparelho reprodutor, entre as quais
a esterilidade e anomalias dos espermatozóides. A experiência dos efeitos das
radiações, a longo prazo, baseada em grande parte em exames clínicos dos
sobreviventes de Hiroshima e Nagasaki, leva a pensar que o número de vítimas do
acidente de Chernobil continuará a crescer nos próximos decénios.
Aos danos físicos provocados pela catástrofe de Chernobil, junta-se o
«síndroma dos deslocados». Muitos dos habitantes, constrangidos a abandonar os
lugares em que nasceram e viveram, são atingidos por formas agudas de stress
psicológico e fisiológico, semelhantes aos que atingiram muitos habitantes de
Hiroshima e Nagasaki, depois do bombardeamento atómico. Tal síndroma – agravado
pela perda de familiares e amigos, do constante temor de ficar doente de cancro
devido às radiações e à dificuldade de adaptação a um outro tipo de vida –
provoca perturbações psíquicas e estados depressivos que conduzem ao alcoolismo.
Muitos, não podendo suportar viver o resto da vida nas condições de deslocados,
voltam nos anos seguintes, às suas casas, mesmo sabendo os riscos que correm: num
raio de 30 quilómetros em volta da da central, está sepultada, em cerca de 800
fossas revestidas de argila, uma enorme quantidade (mais de um bilião de metros
cúbicos) de material tornado radioactivo pela explosão do reactor. Ao drama
destas pessoas, junta-se a tragédia de famílias inteiras, originárias de outras
zonas que, não tendo habitações, vão ocupar as casas de Chernobil que
permaneceram vazias. Este é o trágico balanço, ainda em aberto, da catástrofe
de Chernobil.
A seguir:
3.8 Os movimentos anti-nucleares durante a guerra fria
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