Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu
Introdução
Pepe Escobar
William F. Engdahl é um dos principais analistas geopolíticos do mundo. Seus livros – de Century of War a Full Spectrum Dominance – são absolutamente essenciais para compreender como a nação autodeclarada "excepcional" criou e expandiu seus tentáculos de hegemonia global.
Boa medida para aferir a influência de Engdahl é que por mais que a turma do Departamento de Estado o desqualifique, aqueles suspeitos de sempre leem tudo que ele escreve e não conseguem encontrar argumento que prove que Engdahl errou.
Essa longa entrevista, feita pelo jornalista especializado em finanças Lars Schall é em grande parte dedicada ao Capítulo 3 – "The Rape of Rússia" [O Estupro da Rússia] – do mais recente livro de Engdahl,Manifest Destiny: Democracy as Cognitive Dissonance [port. Destino Manifesto: Democracia como cognição dissonante, sem tradução em português do Brasil (NTs)].
Aqui vocês encontrarão tudo que precisam saber sobre a gênese dos oligarcas russos nos anos 1990s; os negócios sujos da máfia de Yeltsin; tudo sobre o roubo do ouro dos soviéticos, até as operações sujíssimas do irmão mais velho de Bush-pai; a incrível história do ouro de Yamashita; a sujeira dos "cupons de privatização"; o modo como a máfia de Harvard controla a economia russa – até a luta tenaz, duríssima, que o presidente Putin iniciou e combateu ao longo dos anos 2000s para fazer da Rússia uma economia funcional, ao mesmo tempo em que a OTAN continuava a avançar na direção da Rússia.
Como Engdahl observa, se não compreendermos o que aconteceu na Rússia nos anos 1990s é absolutamente impossível contextualizar a incansável campanha de ódio que os neoconservadores e a Think-tank(e)lândia norte-americana movem contra o presidente da Rússia, 24 horas/dia, sete dias por semana.
ATENÇÃO: Em entrevista ao programa Duplo Expresso do dia 16/4/2018, Pepe Escobar comenta o mesmo livro de Engdahl, e o mesmo 3º Capítulo, para dizer o quanto é leitura importantíssima para que se compreenda... o estupro do Brasil, mais ativo a partir de 2016, mas em tudo semelhante ao que foi feito contra a Rússia. A entrevista de Pepe ao Duplo Expresso está aqui. O trecho em que Pepe Escobar fala das semelhanças entre o estupro da Rússia e o estupro do Brasil começa em 27'25" [NTs].
Assim sendo, sente-se, relaxe, curta essa corrida alucinada ladeira abaixo e conserve essa entrevista como referência essencial que você não encontrará em nenhum outro lugar.
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Estupro da Rússia, nos anos 1990s
Lars Schall: Alô, William.
F. William Engdahl: Alô, Lars. Bom estar com você outra vez.
"Como colunista antigo no NYT [incansavelmente repetido e elogiado em UOL Notícias (NTs)], parece que Thomas Friedman já não se sente obrigado a saber coisa alguma que se aproveite, dos temas sobre os quais escreve. É o que explica o comentário sarcástico de que Putin bem podia ser agente da CIA, tantos foram os males que teria causado à Rússia.
Por mais que tivesse tendências autoritárias, o mais provável é que, em todos os casos, a maioria dos russos pensem, antes de tudo, no impacto de Putin na economia, exatamente como fazem os eleitores nos EUA. E nesse front Putin fez muito bom serviço.
Segundo dados do FMI, a economia da Rússia naufragou nos anos 1990s da presidência de Yeltsin. Quando Putin assumiu, em 1998, a renda per capita no país havia caído mais de 40% em relação ao nível de 1990. É uma queda mais funda do que a que os EUA conheceram na Grande Depressão. Desde que Putin está no governo, a renda per capita subiu mais de 115%, e o país teve um crescimento anual médio de mais de 3,9%.
Ainda que o crescimento tenha sido muito desigual, a desigualdade já estava lá nos anos Yeltsin, quando a economia entrou em colapso. O russo médio deu-se muito melhor nas últimas duas décadas de governo Putin, do que quando Yeltsin estava no poder.
Por essa razão são provavelmente poucos os russos que aceitariam com simpatia a especulação de Friedman sobre supostos laços entre Putin e a CIA. Se falasse de Boris Yeltsin, sim, seria outra coisa."
Aí está. Acho que é um bom ponto de partida para nossa discussão, William, porque no seu livro há um capítulo intitulado "O estupro da Rússia: o golpe de estado de Yeltsin da CIA". Por que você fala de estupro nesse caso?
FWE: Falo ali do governo de George Herbert Walker Bush, Bush-pai. O que fizeram, organizado com a CIA, com as velhas redes de contato de Bush-pai, em termos de aleijar a União Soviética, com saque e destruição de patrimônio nacional, roubo à vista de todos, destruição de aposentadorias, pensões, seguridade, sistema de saúde e tudo. A única palavra adequada aí é "o estupro da Rússia". Roubaram tudo que puderam roubar.
Isso que você leu, do Sr. Friedman, é caca de cavalo, mas o quadro da CIA, realmente ativo em todo o processo de colapso da União Soviética no final da década dos 1980s foi mesmo Boris Yeltsin e a chamada Família Yeltsin, a Máfia de Yeltsin. No meu livro, Manifest Destiny, documento e exponho muito detalhadamente a relação de um punhado de altos funcionários da KGB que trabalharam com as redes de veteranos da CIA chefiados por Bush-pai no ocidente e um grupo de oligarcas em torno de Yeltsin, você conhece, os famosos oligarcas russos. Sim, o The New York Times e outros jornalões no ocidente falavam deles como a "Máfia Russa". Eram mesmo uma espécie de máfia. Mas o ponto importante é que eram uma máfia dirigida pela CIA. Eram dirigidos pelo ocidente. Traíram o próprio povo, o próprio país e roubaram da Rússia literalmente bilhões e bilhões e bilhões em dinheiro e em bens. Por isso o capítulo fala de estupro.
LS: E Boris Yeltsin foi essencial no processo.
FWE: Foi a figura chave. Era governador regional, levado para Moscou. Num dado momento, Gorbachev viu-o como estrela em ascensão, como alguém que poderia ajudar com uma imagem um pouco mais liberal que a perestroika. A economia russa estava em frangalhos nos anos 80s, Guerra das Estrelas de Reagan, Nicarágua e, principalmente, a guerra no Afeganistão que é projeto da CIA associada aos Mujahideen, que durou dez anos e sangrou a economia soviética, o "Vietnã da União Soviética", como Brzezinski costumava dizer.
E o ocidente, as redes de Bush-pai, recrutaram um punhado de agentes da KGB em torno de Yeltsin, que literalmente promoveram Yeltsin até o topo, quando arquitetaram o falso golpe de estado de agosto de 1991. Você lembra, tenho certeza de que muitos lembram, a foto de Boris Yeltsin corajosamente sobre um tanque soviético em frente à 'casa branca' dos soviéticos, de onde leu um discurso em que desafiava Gorbachev e tal e tal. Foi um golpe de estado arquitetado por KGB+CIA, em junho de 1991. E mediante essa rede, essa rede corrupta dentro da KGB que trabalhava com a CIA, trabalhando com o general Philip, Bob [ininteligível] é um deles, chamado naquele tempo de 'cérebro da KGB'. Foi o comandante do 5º Diretorado daKGB. Depois passou a trabalhar para [#ininteligível 00:06:40-0#] petróleo e até hoje continua como membro do Parlamento, o que lhe garante imunidades e foro privilegiado.
Quero dizer é que alguns desses ainda estão por aí, depois de 23, 25 anos, e é quase incrível; outros morreram, foram mortos, eliminados ou seja o que for. Mas a operação pôs Yeltsin no poder, essa rede de russos corruptos dentro da KGB e trabalhando com a CIA levaram Yeltsin à presidência da Federação Russa. E quando afinal já tinham o homem deles no comando da Federação Russa, a maior da União Soviética, a República Socialista, estavam em condições de pôr em prática, mediante o Fundo Monetário Internacional, tudo que fosse preciso para supervisionar a 'privatização' da economia soviética.
Arquitetaram e executaram uma abertura completa de todos os bens da Federação Russa, do que hoje se chama Federação Russa, a maior parte da União Soviética. E fizeram isso de tal modo que a Federação Russa assumiria todas as dívidas da Ucrânia, do Cazaquistão e de outras repúblicas socialistas soviética e todos os bens desses estados, todos os bens e propriedades estatais que havia dentro da Federação Russa, como a empresa de alumínio Rusal (foi privatizada, ainda ontem estava nos jornais), a empresa de níquel, o petróleo, o gás, centenas de bilhões, se não de trilhões de dólares em patrimônio público, que ficaram sob controle de Yeltsin.
LS: Essas empresas foram vendidas por preço ridículo.
FWE: Houve estimativas de que entraram no esquema de privatização por cupons [também 'vouchers privatisation'] montada no governo Yeltsin nos anos 90s. A 'privatização por cupons' emitia um cupom por cada homem, mulher ou criança russos, 140 milhões de cupons no total. E o valor desses cupons foi tal que houve quem estimasse que a totalidade de todos os bens da Federação Soviética Russa vendidos equivaleria ao que valem hoje as ações da General Electric Company na Bolsa de Valores de New York. Quero dizer, foi cômico. Rússia estava em bancarrota financeira, por causa da terapia de choque que Jeffrey Sachs e outros de Harvard e de outras universidades levaram para lá, George Soros e gente dele. Criaram-se empresas falidas, que ontem estavam sobre as próprias pernas e de repente... estavam quebradas, sem nada, recurso algum. Mas as empresas, o patrimônio construído, o níquel, o alumínio, o urânio – sobre o qual Hillary Clinton sabe não pouca coisa –, tudo isso foi estimado em trilhões de dólares. Precisamente o butim que interessava à operação de Bush-pai. E usaram ONGs, usaram o National Endowment for Democracy, usaram a Open Society de George Soros e tal e tal, para fazer acontecer.
LS: Você já falou da tentativa de golpe de Estado de agosto de 1991. Muito importante para o que aconteceria foi algo que teve lugar no início de 1991: o roubo do ouro dos soviéticos. Por favor, fale-nos sobre isso.
FWE: É momento crucial, ainda na União Soviética, para a transição que Washington impôs à Federação Russa, porque Yeltsin, acho que desde que não lhe faltasse vodca, ele não protestava muito. Mas no sistema soviético, e a Federação Russa manteve, havia um banco estatal, não um banco central privado como o Federal Reserve ou o Banco Central Europeu hoje, mas um banco estatal, que foi entidade do aparelho do Estado Russo e era chamado de Gosbank. Um homem chamado Viktor Gerashchenko era presidente do Gosbank quando Yeltsin começou, em 1991.
E esse Gerashchenko fez um discurso, mais ou menos naquele momento, em novembro de 91, perante o Parlamento (Duma) Russo ou o parlamento que lá estivesse, e disse "Devo relatar a vocês, senhoras e senhores, que, das estimadas 3 mil toneladas das reservas em ouro do Gosbank estatal, só podemos apresentar 400 toneladas." Na sequência, teve de explicar, a membros do Parlamento, lá, em estado de choque, que ninguém tinha nem ideia do que acontecera ao ouro, como e por que sumira – o que, claro, era mentira. E Gerashchenko havia criado, pouco depois de 1989, para preparar esse golpe de estado – o golpe de estado da CIA e dos 'meninos' de Bush-pai –, ele havia criado uma coisa chamada Financial Management Co. (FIMACO) na Ilha Channel, nas Ilhas Jersey, para movimentar as reservas russas em moeda estrangeira.
E Jersey estava fora da supervisão europeia. Era portanto lugar perfeito para esconder dinheiro sujo ou roubado, e movimentaram algo como $37 bilhões entre 1993 e 1998. Gerashchenko e o Gosbank chegaram a contratar uma empresa de detetives em Nova York, especializada em investigações financeiras, uma CIA financeira, que naquele momento chamava-se Jules Kroll Associate. Receberam ordens para rastrear o ouro soviético, descobrir o que acontecera ao ouro e a algo como $14 bilhões de fundos do Partido Comunista que também haviam sumido. E a Kroll, ligada à CIA ligada a Hank Greenberg do AIG Insurance Group, nome que você recorda, de 2008, nos 'resgates' de Henry Paulson.
LS: Lembro.
FWE: Passados poucos meses, a Kroll Associates anunciou que não encontrara coisa alguma, na investigação para descobrir o ouro do Gosbank soviético. Então, acrescentando insulto à injúria, o FMI intrometeu-se e reescreveu a Constituição da Federação Russa no governo de Yeltsin e assumiu o poder de emitir dinheiro, assim como o Federal Reserve tirou do Congresso o poder de criar dinheiro, em 1913. Tiraram do estado o poder de criar dinheiro e criaram o Banco Central da Federação Russa, o Banco Central da Rússia, e lhe deram mandato para duas coisas. Uma, para controlar a inflação; a outra, para criar estabilidade monetária.
Quero dizer, na Rússia, naquele dia, significou estabilidade do rublo em relação ao dólar norte-americano. Assim sendo, a criação de dinheiro russo, a partir daquele dia, foi soldada ao EUA-dólar. E infelizmente, essa emenda à Constituição lá está, vigente até hoje. É uma das dificuldades que Vladimir Putin enfrenta para persuadir o Banco Central Independente a reduzir mais rapidamente as taxas de juro, dado que a inflação está simplesmente administrada, como problema, na Rússia, nos últimos dois anos.
Equivale a dizer que, assim, saquearam o ouro e garantiram que o rublo jamais alcance a estabilidade. Se você não tem lastro em ouro, os investidores ocidentais passarão a não confiar em você, que foi mais ou menos o que aconteceu. Em seguida, começaram a trabalhar com grupo muito seleto de banqueiros ocidentais, para tirar da Rússia o dinheiro que ainda tivessem lá.
LS: Valmet and Riggs foi importante para tirar o dinheiro da Rússia. Você pode falar por favor sobre pessoas chaves que então trabalhavam para Valmet and Riggs?
FWE: Valmet and Riggs era uma espécie de fusão de um banco suíço com o Banco Riggs de Washington, DC. E o Banco Riggs, realmente é aspecto fascinante e muito pouco discutido da questão russa nos idos dos anos 1990s.
Havia, sim, uma coisa chamada Banco Riggs em Washington, criado décadas antes, desde a operação dos anos 1960s, da CIA, na Baía dos Porcos, e desde então era conhecido como o banco ligado à CIA. Investiam dinheiro de gente como Marcos das Filipinas, enquanto foi íntimo da CIA. E havia um ex-embaixador à OTAN de nome Alton Keel, em 1989, e os generais da KGB soviética mantinham um grupo de 'protegidos', que Bush-pai chamava de "os meninos". Os protegidos tinham todos em torno de 30 anos, uns poucos já chegavam aos 40, mas bem jovens. Esses foram nomeados para serem os oligarcas, os homens de frente que controlariam as empresas e valores privatizados, alumínio, petróleo e tudo mais que foi saqueado da Federação Russa.
E Alton Keel, justo quando os russos estavam reunindo pessoal num banco pelo qual os oligarcas pudessem movimentar as respectivas fortunas roubadas, roubadas mesmo, Keel deixou a OTAN e o Conselho de Segurança Nacional para se tornar diretor da operação internacional e vice-presidente do Banco Riggs em Washington.
Agora é que vem o mais interessante, porque a operação internacional do Banco Riggs incluía uma nova entidade que havia sido criada, chamada Riggs Valmet S.A, na Suíça, e Riggs Valmet fora criada por um homem de nome Jonathan J. Bush, banqueiro privado, e irmão de Bush-pai. Assim aconteceu que o irmão de Bush-pai e Alton Keel montaram a Riggs Valmet. Havia um aparelho para lavagem de dinheiro em Genebra, e Riggs então, com a ajuda desse aparelho, comprou o controle acionário da Valmet de Genebra, criando Riggs Valmet.
Assim temos afinal o irmão do então presidente dos EUA, metido até a testa nessa grande operação Yeltsin-CIA de lavagem de dinheiro. Foi quando Jonathan Bush foi posto na presidência executiva de algo chamado Riggs Investment em Connecticut onde vivia. Desse ponto em diante, tornou-se simplesmente impossível deter o saque e a retirada do patrimônio russo de dentro da Rússia. Foram bilhões, dezenas de bilhões de dólares.
LS: William, há um sujeito que trabalhava muito perto dessa gente e estava trabalhando em Wall Street, mas depois foi pessoalmente recrutado por George Tenet, então diretor da CIA, para ser o número três na CIA: Alvin Bernard “Buzzy" Krongard.
FWE: É verdade. Aí encontramos “Buzzy" Krongard, no Bankers Trust, trazido por Alex Brown, e Krongard tornou-se vice-presidente do Bankers Trust, com outro sujeito de caráter exemplar, de nome Carter Beese. E, no momento do colapso de 1998 do rublo, Krongard foi nomeado formalmente, como você destacou, número três, diretor-executivo na CIA de George Tenet. Isso, para que se veja que foi uma rede da CIA do começo ao fim, desde o lado banking até diretamente o lado CIA. Tem-se Carter Beast, tem-se “Buzzy" Krongard e Jonathan Bush e Alton Keel e eram os sujeitos que trabalhavam com Valmet, como eu disse, com o Banco Riggs Valmet em Genebra, para arrancar todo esse dinheiro mediante empresas de fachada.
E os oligarcas. Parte interessante de toda essa coisa é quando se vê hoje, precisamente hoje, Theresa May e o secretário de Relações Exteriores da Grã-Bretanha, Boris Johnson – que acusam Putin de ter assassinado todos os mortos desde o nascimento de Jesus Cristo. E justamente um desses assassinados recentes (Nikolai Glushkov) era a pessoa de mais confiança, seu guarda-costas pessoal, de um dos oligarcas que vivem em Londres, Boris Berezovsky.
E Berezovsky é um dos oligarcas mais sujos. Financiou a Revolução Colorida na Ucrânia, em 2003-2004, como vingança contra Putin, porque pensou que Putin pudesse ser comprado como Yeltsin; e de repente se viu em luta contra a facção dos nacionalistas, dentro do que fora a KGB, e que queriam estabilizar e preservar a Rússia como a nação funcional que é hoje. E também Mikhail Khodorkovskyi, Roman Abramovich, cujo nome está na lista de sanções de ontem, e Berezovsky eram alguns dos principais oligarcas gerados nessa operação dos Bush.
LS: E temos de falar também de algo que é... francamente, que é mais estranho, mais estranho que qualquer ficção, uma coisa chamada "Ouro de Yamashita". Se alguém que nos ouve agora tiver interesse nessa história, pode ler, por exemplo, artigo assinado por Chalmers Johnson, conhecido especialista em questões asiáticas, intitulado The Looting of Asia, que foi publicado na London Review of Books dia 20/11/2003, porque lá se encontra facilmente alguma coisa sobre esse assunto do ouro de Yamashita, na Internet. Acho justo oferecer mais essa indicação...
FWE: É verdade.
LS: … porque fato é que ninguém realmente conhece essa história completa. Por favor, conte-nos tudo.
LS: Basicamente, de 1895 até 1945.
FWE: É. É. E dado que não havia qualquer garantia de que o Japão pudesse vencer a guerra, o imperador ordenou que o ouro fosse escondido fora de lá, sobretudo nas Filipinas, tanto quanto se sabe, e literalmente número até hoje ignorado de toneladas de ouro foram enterradas em túneis subterrâneos fundos, pelas Filipinas, e o pessoal que escavou os túneis foram, muitos deles, mortos a tiros, para que não revelassem a localização dos túneis. Mas Marcos, que de início foi quadro da CIA e depois ditador das Filipinas ao longo de quase toda a década dos 70s, e já entrados nos 80s, Ferdinand Marcos, sabe-se lá como, acabou por encontrar parte desse ouro. E os soldados japoneses, no início dos anos 40, antes do fim da guerra, receberam ordens do Imperador Hiroito para enterrar o ouro, se perdessem a guerra.
E num dado momento, nos anos 1970s, Marcos descobriu alguns desses pontos onde os soldados de Hirohito haviam enterrado o ouro, o ouro roubado da China, da Coreia, das Filipinas, da Indonésia e de outros países ocupados pelas forças japonesas. E Marcos – e acho que aí está uma das principais razões pelas quais a CIA acabou com ele, tornou-se um pouco ambicioso demais, e passou a mão naquele ouro e começou a vender por fora do mercado, servindo-se dos serviços secretos de alguns seletos bancos suíços. Mas usou um quadro da CIA, o bilionário saudita Adnan Khashoggi para ajudá-lo a vender o ouro fora do mercado. E sequer suspeitou de que Khashoggi lhe passaria a perna [risos]. Mas passou, no instante em que conseguiu melhor negócio oferecido a ele por Bush-pai e os tais "meninos" dele.
LS: É preciso dizer que Khashoggi é nome envolvido, por exemplo com o Bank of Credit and Commerce International, BCCI, fundado em 1972; e envolvido também no caso 'Irã-Contras'.
FWE: Nos anos ‘70s, estava envolvido em todas as sujeiras em que operavam os Bush e a CIA. No Banco B.C.C.I., banco que lavava dinheiro para a CIA, nos negócios de armas, Khashoggi era grande comerciante de armas durante a guerra Irã-Iraque que a CIA estava alimentando. Participou de praticamente todos os negócios sujos que a CIA estava fazendo.
LS: E sabia do ouro.
FWE: O que se sabe é que ele ajudava Marcos a vender o ouro fora do mercado. Quer dizer: não apenas sabia. Ele estava bem no centro da coisa toda. Mas depois que Marcos deixou de ter utilidade, a CIA de Bush livrou-se dele, em 1986. Foi quando um homem chamado Paul Wolfowitz, com Richard Armitage e Khashoggi começou a trabalhar com alguém no Canadá para criar – o nome é Peter Munk, empresário muito dúbio –, para criar algo chamado Barrick Gold do Canadá, que viria a ser, depois, a maior empresa de mineração de ouro do mundo.
Mas Barrick Gold... Todas as provas de que se dispõe mostram que essa empresa foi usada para fundir o ouro – não quero entrar muito nesses detalhes, mas Barrick Gold foi usada basicamente para fundir o ouro do Imperador Hirohito que Marcos encontrou nas Filipinas. Para fundi-lo e usar como colateralidade para derivativos, que seriam declaradamente usados para passar a mão no patrimônio russo.
LS: Basicamente, o dinheiro foi basicamente transformado em empréstimos bancários na Rússia, de modo que os que viriam a ser os oligarcas pudessem comprar aquele patrimônio…
FWE: Sim, exatamente. Assim, Yegor Gaidar, conselheiro de Yeltsin para a privatização da economia, e seu assecla Anatoly Chubais mais ou menos orientaram todo esse processo, junto com Jeffrey Sachs e um grupo da Universidade Harvard.
LS: É. Vamos falar sobre isso. É o que se conhece como Terapia de Choque Jeffrey Sachs, ou Terapia de Choque de Harvard [28"40', fim da primeira parte].*******
Bush-pai foi diretor da CIA, "dos mais amados diretores que jamais tivemos", como se lê na página oficial da Agência. De 1981 a 1989 foi vice-presidente; e dali até 1993, foi presidente dos EUA, depois de Reagan. Na disputa para a reeleição, foi derrotado por Bill Clinton [NTs].
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